14 Lições de um projetista inconformado: Os aprendizados mais importantes em 5 anos trabalhando como engenheiro de instalações.

Seis anos atrás, eu me sentei em frente a um computador para elaborar meu primeiro projeto, sem ter a mínima ideia de onde aquilo me levaria. Se alguém do futuro me dissesse que, no primeiro ano da minha carreira, eu participaria de mais de 20 projetos, me tornaria líder técnico em instalações e, com cinco anos, já teria trabalhado em grandes escritórios atendendo às maiores construtoras do país, com certeza ficaria orgulhoso — afinal, a parte mais sonhadora dentro de mim acreditava nisso. Mas o que eu nunca imaginaria é que, nesse exato momento, eu perceberia uma realidade desagradável. Está tudo errado no mercado de instalações e, como um grande colega sempre repete.

“As instalações são o grande câncer da construção civil no nosso país.”

Precisamos evoluir….

Empresas que prometem “Ferraris” mas não conseguem entregar nem um “Fusca”. Equipes de projeto onde quase ninguém se deu ao trabalho de ler sequer um catálogo. O BIM para maior parte dos players virou uma mentira confortável que todo mundo repete para se sentir melhor, enquanto a maioria dos contratantes não fazem ideia de como extrair o real valor de seus projetos.

Digital Transformation: The Future of Connected Construction, Autodesk.

Segundo a Autodesk o Brasil lidera o ranking mundial de investimento em BIM, e qual o resultado? Atrasos em todas as etapas dos empreendimentos, estimativas de custo que nunca se concretizam e projetistas sobrecarregados, enfrentando jornadas extremas de trabalho. E nesse exato momento, você deve estar se perguntando: quem é o vilão?

A minha resposta talvez não agrade: somos todos nós. Está no nosso DNA — o famoso “jeitinho brasileiro” de ser desenrolado, habilidoso, de resolver tudo no improviso, mestres em fazer uma gambiarra de respeito, porém isso não nos favorece quando precisamos construir edificações complexas e lucrativas. Passou da hora de evoluirmos nossa cultura de gestão e planejamento de obras. Observe alguns dados levantados pela pesquisa: Maturidade BIM no Brasil, realizado pela GrantThornton, Sienge e ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial).

Apesar dos expressivos investimentos públicos e privados, 59,42% das organizações classificam sua maturidade BIM nos níveis mais baixos, desconsiderando uma parcela significativa de 16,53% que não responderam, enquanto apenas 2,51% alcançam os patamares superiores.

Mapeamento: Maturidade BIM no Brasil.

Minha sensação era de que havia falta de comprometimento da gestão e de investimento, mas a realidade é que apenas uma pequena parcela das empresas enfrenta esse tipo de problema.

Mapeamento: Maturidade BIM no Brasil.

Você pode pensar que a pesquisa está enviesada, já que existem a possibilidade de somente pessoas da diretoria terem participado. A seguir, apresento a distribuição dos cargos dos respondentes para que você tire suas próprias conclusões.

Mapeamento: Maturidade BIM no Brasil.

Não sei quanto a vocês, mas não quero exercer minha profissão em um cenário frustrante, com resultados e retornos medíocres. Trabalhamos em um dos setores mais importante do país e, ainda assim, viramos motivo de piada no consciente coletivo.

“O engenheiro ele forma para trabalhar com qualquer outra coisa menos como engenharia… Motorista de aplicativo só tem engenheiro, a gente é assim…” – Renato Albani

Calma, não fique com raiva do Renato ou da população em geral – eles têm razão, e a situação é, de fato cômica. Existem milhares de motivos culturais e políticos que nos levaram a esse ponto, e a comédia ou os memes são apenas um retrato da realidade. E cabe a todos nós transformar essa realidade.

Retirado do Reddit:

E o mais contraditório é que, enquanto milhares de engenheiros formados trabalham em outras áreas e não exercem a profissão, as empresas do setor enfrentam uma escassez crítica de profissionais qualificados. A FGV aponta que, em 30% das empresas, a falta de mão de obra é o principal problema – sim, o principal. Reflita: o número de empresas com dificuldades para encontrar profissionais qualificados é ainda maior.

A qualidade do ensino em nossas academias é um dentre os inúmeros vilões que contribuem para esse cenário. Além das coisas óbvias como formato defasado, grade incompatível com mercado de trabalho, falta de prática e de profundidade no conteúdo ministrado. Para minha surpresa, descobri que, durante a graduação, nos estudamos em média, 3500h, que representa apenas metade do tempo dedicado por um estudante da Escola Politécnica de Milão (Itália), 7600h uma diferença de 52%. Esses dados foram levantados para a graduação de Arquitetura, e, considerando a paridade entre os cursos de Arquitetura e Engenharia no Brasil, é razoável supor que o cenário seja semelhante em Engenharia.

Agora que você visualizou o mesmo cenário que eu, resumindo:

  • Desperdício de recursos;
  • Projeção de prejuízos bilionários no setor;
  • Escassez de profissionais competentes;
  • Desinteresse pela capacitação entre os nossos pares;
  • Recém-formados completamente despreparados, sem a fundação necessária para crescer;
  • Uma massa de péssimos profissionais que repetem o superficial – BIM isso, BIM aquilo, LOD, LOI, BEP, Digital Twin, IFC, OpenBIM, buildingSMART… – mas não consegue sustentar uma conversa por dois minutos sobre o porquê ou como utilizar cada um desses conceitos, sem entregar resultados reais e enganando aqueles que acreditam nessas promessas.

Agora espero que entendam a minha motivação para compartilhar as lições mais valiosas que obtive ao longo desses anos de profissão. Se você também quer romper esse ciclo e evoluir junto comigo, abra seu bloco de notas ou o seu Notion, mantenha a mente aberta e vamos começar!

14 Lições de um projetista inconformado

Antes de mais nada, um aviso importante: o que você vai ver aqui não é verdade absoluta nem está escrito em pedra. Estou totalmente aberto a discutir cada uma dessas ideias, melhorá-las ou até reconhecer que estava equivocado. Quero te encorajar a compartilhar a sua opinião, a refutar ou a complementar estes aprendizados, para que possamos evoluir juntos.

0. Nem todo cliente é para você

Durante minha jornada, já conversei com muitos projetistas que afirmam ser impossível adotar algumas documentações ou fluxos de projeto que abordarei aqui, dizendo que a realidade é outra. Concordo que precisamos flexibilizar, mas devem existir aspectos inegociáveis na forma como você trabalha, pois, se não forem seguidos, trarão muitas dores de cabeça no futuro. Cabe a você entender que certas pessoas não deveriam ser seus clientes, já que clientes problemáticos não dão lucro.

Não ter um briefing, não levantar requisitos, não definir etapas de aprovação ou designar um responsável pela comunicação e suporte aos projetistas são alguns dos ingredientes que levam o caos a um escritório de projetos. Esse caos se manifesta em revisões por preferência pessoal, mudanças de última hora e reuniões para discutir soluções após toda a documentação ter sido entregue. Isso destrói suas margens e sua sanidade mental. O processo de contratação deve ser uma via de mão dupla: você se adequa ao cliente e valida se o cliente está adequado a você.

A partir do momento em que você trata certas coisas como inegociáveis e o valor que elas entregam ao seu cliente, é quando conseguirá aplicá-las. Falo com convicção porque foi assim que conduzi minha carreira, implementando fluxos de projeto sensacionais com levantamentos de requisitos, entregas parciais, ciclos de aprovação, compatibilização de disciplinas durante o desenvolvimento e sendo a ponte de alinhamento com as construtoras, escritórios de arquitetura e o cliente. Tudo isso, na maior parte do tempo trabalhando no estado de Sergipe e cobrando valores bem acima da média de mercado. Na minha inocência, eu achava que fazíamos o básico e queria aprender com os grandes. Mas, ao chegar lá, percebi que a realidade era outra. Não pense que foi um mar de rosas: também errei muito, e a maioria do que quero compartilhar com vocês nasceram justamente desses erros.

1. O que você entrega ao seu cliente não é um projeto

O que o cliente recebe é a documentação do projeto; o ato de projetar é anterior e vai muito além disso. O projeto refere-se à definição de como as instalações serão efetivamente executadas no futuro. Não me entenda mal: a documentação é extremamente importante, mas a qualidade do projeto não é definida por ela – afinal, uma solução ruim, por mais bem documentada que seja, não tem valor algum. No mínimo o mestre da obra vai dar de presente à filha dele para que ela brinque de colorir.

Para ilustrar, vamos voltar à origem da palavra “projeto”, derivada do latim projectus, que significa “intenção de fazer ou realizar algo”. Essa intenção é o verdadeiro valor do seu trabalho: definir soluções e validar possibilidades que transformarão o empreendimento.

É justamente nessa atividade que você deve concentrar seus esforços – em projetar a solução mais adequada, e não em documentar cada pequena conexão presente em uma prancha. Observe a ênfase na palavra “adequada”, um conceito que aprofundaremos na lição 4. Em resumo, é muito mais valioso para o seu cliente que você dedique seu tempo à busca da solução, do que se prender à minúcia da documentação.

2. Aprenda a projetar antes de aprender a documentar

Esta lição complementa a anterior: se você compreendeu que o mais importante de um projeto é desenvolver soluções – ou seja, descobrir como levar a água do ponto A para o ponto B – então é lógico que seus maiores esforços devem ser voltados para construir um repertório robusto de soluções. Isso significa aprender com os erros de terceiros, estudar diferentes catálogos técnicos e experimentar trabalhar com uma variedade de materiais.

Entender quais normas são necessárias para cada solução é essencial – e, embora essa parte normativa seja uma delícia de discutir, vamos aprofundá-la no próximo capítulo. Em resumo, criar um arsenal de soluções e saber como escolhê-las é muito mais valioso do que aprender a modelar um banheiro padronizado em dois minutos ou colocar todas as tags em um isométrico.

Para além do fato de que essas habilidades serão as primeiras a serem automatizadas – inclusive, estou trabalhando nisso – pensar que você está economizando tempo é uma ilusão sedutora. Enquanto você pode economizar alguns minutos na documentação, pode acabar gastando horas ou dias em revisões solicitadas pelo chefe ou pelo cliente na aprovação do projeto, além da energia mental absurda gasta com sua insegurança, se perguntando se o que está fazendo é adequado ou não, durante todo o projeto. Tenha isso bem claro: você não quer perder tempo revisando soluções, e esse retrabalho compromete os lucros da sua empresa.

3. Seja profundo ou pague o preço: domine a técnica

Se você já não está começando sua vida profissional hoje, sabe que as expectativas em torno do engenheiro de instalações são altas. As pessoas querem segurança e a sensação de que você domina todas as possibilidades de resolver um problema, apresentando argumentos convincentes de que a solução proposta atenderá às suas expectativas. Memorizar qual solução é melhor em determinada situação pode ser simples, mas compreender os anseios do cliente e saber argumentar os prós e contras de cada escolha é o verdadeiro desafio.

Exemplos, histórias, leis, decretos, orientações normativas e estudos de caso são os ingredientes que conquistam a confiança do cliente. Vou contar uma situação que vivi: enquanto trabalhava com residências de alto padrão, uma cliente me questionou: “Já morei em diversas casas e construí algumas, mas nunca vi um projeto elétrico tão caro quanto este.” Ela se referia aos equipamentos de segurança e ao custo das fiações adotadas. Mesmo sendo elétrica minha disciplina mais fraca, eu entendi o recado. Perguntei onde ela havia morado, e ela respondeu: “No interior do estado.” Era exatamente o que eu precisava para conquistar a confiança dela.

Respondi que, de fato, na maioria das casas do interior não há projetos realizados por engenheiros, e acabamos considerando normal algumas coisas bem estranhas e perguntei: “Você também não acha estranho quando, ao ligar o chuveiro, a luz pisca? Ou quando não é possível acionar outro aparelho com o chuveiro ligado sem que o disjuntor dispare? Já passou por um curto que resultou em alguma fiação pegando fogo ou saindo fumaça? Já perdeu uma TV ou geladeira por conta de problemas elétricos?” As respostas foram afirmativas, e então expliquei que dimensionamos todos os componentes de acordo com a demanda e o uso pretendido para o empreendimento, garantindo que, durante o seu dia a dia no empreendimento, ela não enfrentasse esses transtornos nem colocasse a vida da família em risco por um surto elétrico ou incêndio.

Não entrei em detalhes, porém, durante a conversa, detalhei por que usamos cabos de bitolas maiores e a importância de dispositivos de proteção específicos em determinados circuitos. Agora, imagine se eu não soubesse dimensionar a bitola de um cabo, conhecer as orientações de segurança para ambientes molhados ou entender como a demanda dos equipamentos impacta o sistema. Eu não conseguiria associar esses conhecimentos com minha experiência prática, e, consequentemente, não convenceria a cliente de que nossas soluções atenderiam às suas expectativas. Isso resultaria em vergonha e transformaria o casal em críticos do nosso projeto. Mas, nesse caso, tenho certeza de que ela se tornou a maior defensora do nosso trabalho. Em todas as visitas posteriores a sua obra, nossas soluções foram implementadas corretamente pela equipe, e ela inclusive pediu que a gente orientasse a construtora para que o nosso projeto fosse executado integralmente.

Agora você deve entender que ler as normas, compreender o dimensionamento, as orientações dos fabricantes e estudar os prós e contras de cada decisão é essencial para conquistar os seus clientes. Gosto de pensar que não existe solução certa ou errada – cada opção é uma ferramenta que pode ser usada conforme a situação do contratante: alguns buscam conforto, outros segurança, e a maioria, economia. Assim, você escolhe a ferramenta que melhor atende às necessidades dele.

É importante ressaltar que não incluo na minha caixa de ferramentas soluções que possam colocar em risco a vida dos usuários ou que não cumpram os requisitos mínimos normativos de conforto e durabilidade.

Porém, tudo isso pode se tornar uma armadilha – e é sobre isso que abordaremos na lição número 4. Vamos nessa.

4. Não presuma que você sabe o que é melhor para o cliente

Te convido a parar e refletir: quantas vezes você achou que precisava muito de algo, acreditou que aquilo seria o melhor para sua vida e, depois de um tempo, percebeu que estava totalmente errado – ou sequer soube qual roupa seria mais adequada para determinada ocasião? Não é difícil encontrar um exemplo desses, certo? Agora, me responda: se você não consegue ter certeza do que é melhor para você, como pode pensar que sabe o que é melhor para os seus contratantes?

A resposta é simples: é impossível. Sua missão, durante todo o projeto, é entender o que seu cliente considera importante, identificar as variáveis impactadas por cada decisão, apresentar os caminhos possíveis e mostrar os impactos positivos e negativos de cada escolha. Ou seja, você precisa buscar a solução mais adequada para a situação atual, ciente de que os requisitos podem mudar de uma obra para outra.

Como alcançar tudo isso a partir de um briefing ou levantamento de requisitos? Eu sei que nem todo cliente está disposto a preencher um documento ou participar de uma reunião longa. Por isso, recomendo que você tenha um formato base e diversas alternativas: pode ser um formulário, uma planilha, um documento de texto ou até um aplicativo, que permita coletar informações gradualmente. Em último caso, para clientes mais difíceis, mantenha o chamado “briefing fantasma”, onde você coleta os pontos essenciais durante a conversas pelo Whatsapp ou ligações, onde você vai questionando os pontos críticos ocasionalmente, ele não sabe que está respondendo um briefing e você tem todas as informações que precisa.

O que não pode acontecer é você ficar sem ideia do que o cliente realmente precisa, pois isso resultará em inúmeras dores de cabeça com revisões, ligações questionando suas escolhas e, no pior dos casos, problemas sérios durante a obra.

Não me entenda mal: não estou dizendo que devemos seguir cegamente o que o cliente ordena ou que ele deva tomar todas as decisões. Muitas vezes, o cliente não sabe o que precisa ou pode estar equivocado em alguma decisão. Seu papel não é terceirizar as decisões de projeto, mas sim compreender qual produto final o cliente deseja, identificar os caminhos para alcançá-lo e guiá-lo nesse processo.

Quando o cliente sabe o que quer e a solução que ele escolheu é adequada – ou não tem impactos significativos – o caminho é simples: siga o fluxo. Porém, quando o cliente tem uma visão equivocada, é nesse momento que mostramos nosso valor.

Vou compartilhar um relato: em um empreendimento, o local sofria com frequentes problemas de falta de água e o cliente, decidiu que queria uma reserva gigantesca – suficiente para quase um mês de consumo. Essa exigência impactava significativamente o projeto, já que a arquitetura não previa tal volume. No nosso processo, detectamos esse requisito e, ao invés de descartá-lo, apresentamos alternativas. Estudamos o consumo de outro local semelhante, analisamos a viabilidade de dimensionar a reserva e detalhamos os cuidados e sistemas adicionais necessários para garantir a potabilidade da água. Embora a falta d’água na região normalmente se limitasse a um ou dois dias devido ao racionamento da concessionária, oferecemos três opções, levantando os pontos positivos e negativos de cada uma, e deixamos clara a nossa recomendação. No final, o cliente optou por uma reserva que atendia a três dias de consumo, sem necessidade de tratamentos extras. O que mais o impactou foi ver o comparativo do consumo no outro empreendimento – algo que, para mim, parecia óbvio, mas que ele não tinha analisado. Esse foi apenas um dos inúmeros casos em que percebi que, estava equivocado sobre o que influenciaria, ou o que era importante, para o cliente e consequentemente o que ele realmente precisava.

E é por isso que eu nunca assumo que sei o que é melhor para os meus clientes.

5. Desenvolva o projeto COM seu cliente

É muito mais simples atender às expectativas do cliente quando ele está envolvido no processo de desenvolvimento. Dessa forma, você cria pontos de verificação (checkpoints) para que o cliente valide cada etapa e, caso seja necessário revisar algo já aprovado, você tem a possibilidade de negociar aditivos contratuais.

Para que isso funcione, segmente as entregas: defina um escopo claro para cada etapa e deixe bem explícito que o projeto só avança após a aprovação do cliente. E ainda mais explícito que se for preciso retornar a algo previamente aprovado, esse retrabalho será cobrado. É claro que, se a revisão ocorrer por uma falha sua, mesmo após a aprovação, é seu dever corrigi-la.

Sugiro que você estabeleça, no mínimo, três etapas: estudo preliminar, pré-executivo e executivo. Esse processo já reduz significativamente os problemas com revisões imprevistas, já que você vai entregar o mínimo de informação em cada etapa, fique tranquilo você vai entender melhor sobre isso na lição de número 8.

O ideal é adotar uma abordagem ainda mais detalhada, com fases como estudo preliminar, lançamento de pontos, anteprojeto, pré-executivo e projeto executivo – Caso seu cliente trabalhe em outro formato ou não concorde com tantas entregas, aplique todas as etapas para aprovação interna.

Adotando essa postura, você identificará e corrigirá erros mais rapidamente, minimizará o retrabalho ao mudar de solução e evitará o problema de ter que refazer toda a concepção após a documentação completa.

6. Você NUNCA vai terminar um projeto

6. Você NUNCA vai terminar um projetoQuem nunca errou tentando entregar o projeto perfeito ou gastou mais tempo do que deveria em uma etapa para satisfazer seu próprio ego ou se desafiar a entregar o melhor trabalho? Isso é muito comum para quem preza pela qualidade. Eu cometi inúmeros erros relacionados a isso – mais do que você pode imaginar. E a maior parte dos meus atrasos entram em uma dessas três caixas: capricho de mais, resolver problemas que não deveria ou estimar um tempo menor do que deveria.

Minha meta era que a entrega atual deveria ser a melhor entrega da minha vida, mas nesse tempo eu não fazia ideia do quão equivocado estava. Existem dois grandes erros nesse ponto: primeiro, você não consegue definir objetivamente todos os aspectos que precisam ser aprimorados para que um projeto seja melhor do que o anterior, afinal, cada empreendimento é único e, provavelmente, para clientes diferentes; segundo – e pior – seu cliente provavelmente não te pagou para produzir o melhor projeto de sua vida. Mas você vai entender melhor isso no próximo tópico.

Durante muito tempo, eu não compreendi uma frase que um colega de trabalho repetia para mim constantemente. Embora fosse dita com um tom cômico, hoje percebo a profundidade de suas palavras e entendo o que ele realmente tentava me ensinar:

“Você nunca termina um projeto, você desiste.” – Yuri Santana

Ps.: Se você estiver lendo isso, levou um bom tempo, mas, você conseguiu.

Não pense que estou dizendo para fazer um trabalho meia-boca ou que você nunca deva entregar mais do que o combinado. O que quero dizer é que você nunca atingirá a perfeição e nunca conseguirá realizar todos os estudos de custo, análises de traçados e discussões de soluções que julgou serem necessários durante o desenvolvimento do projeto. Em cada um dos projetos que entreguei, sempre havia pontos que eu queria retomar e estudar com mais profundidade. Sempre existiu um traçado que, embora estivesse bom o suficiente, não me deixava completamente satisfeito.

E aqui está o nosso mantra: “Está bom o suficiente?” A solução precisa atender às expectativas do cliente e estar dentro do orçamento disponível. Lembre-se de que cada hora dedicada ao projeto tem um custo. É fundamental saber qual é a quantidade máxima de horas para cada projeto – e isso não equivale aos dias combinados com o cliente. Se o prazo é de 90 dias, não significa que você passará 90 dias projetando. Coloque essa questão no topo das suas prioridades: ao fechar um contrato, tenha clareza sobre quanto custará produzir o projeto e qual o lucro pretendido. O custo de um projeto é 80% das horas trabalhadas; se você não tem controle sobre isso, já sabe…

Por isso, em algum momento, entendi que nunca cheguei a terminar um projeto, o que acabavam eram os recursos disponíveis. Contudo, a maior parte deles foi boa o suficiente para deixar o cliente extremamente satisfeito com a qualidade – mesmo que, internamente, eu não estivesse completamente em paz com o resultado.

7. Se pergunte a todo momento: estou sendo pago pra fazer isso?

Em minha experiência como projetista – e também dado consultoria ou treinando outros profissionais – identifiquei três fases no comportamento de um engenheiro à medida que evoluímos e ganhamos experiência. No início, muitos pensam: “Eu consigo fazer isso”, repetindo essa ideia, seja em forma de pergunta para seu líder ou se autoafirmando, quando precisam resolver um novo desafio. Essa postura, é natural no início e não deve ser motivo de preocupação.

Depois de alguns projetos, a mentalidade muda para “Eu devo fazer isso”, seja questionando ao líder ou afirmando para si mesmo. Nesse estágio, é preciso ter cautela, pois essa postura pode nos levar por caminhos perigosos. Por exemplo, imagine que você está na fase executiva do projeto, produzindo todas as pranchas e a documentação, quando surge um e-mail do cliente informando que, devido a uma questão estrutural, algumas prumadas precisam ser realocadas. Se você pergunta a si mesmo: eu devo fazer isso? Um lado seu dirá que sim, vai se enganar dizendo que não dará tanto trabalho e que é seu DEVER entregar um projeto bom projeto e resolver os problemas do cliente. Essa é a armadilha do “devo fazer isso”: Essa postura carrega muitas nuances e agir por obrigação ao dever, pode nos levar a decisões emocionais, sem calcular todas as consequências na entrega e rentabilidade do seu produto.

Na terceira fase, depois de diversas experiências em que você sacrificou seu tempo apenas para cumprir o “dever” – e percebeu que, por mais que agrade o cliente, ele sempre vai querer mais –, finalmente começamos a fazer a pergunta correta: “Estou sendo pago para fazer isso?” Aqui, o questionamento é se aquela tarefa está realmente prevista no escopo do contrato, e nada mais que isso, é uma postura objetiva. Se a resposta for não, é hora de conversar com o cliente e negociar as condições para realizar a atividade, afinal, não estamos fazendo trabalho voluntário ou em uma ONG.

Sei que muitos temem cobrar aditivos, imaginando cenários em que o cliente nunca mais os contrate. Porém, se o seu escopo foi bem definido e revisado com ele, um cliente sensato simplesmente negociará o valor. Caso ele reaja de forma exagerada, alegando desconhecimento, ou que não concorda, e você ainda não sabe como agir, volte para o início e leia o aprendizado 0, pois você ainda não o entendeu.

Também não estou dizendo que você nunca pode fazer favores ou flexibilizar em questões menores para BONS clientes. Nessas situações, faça isso, mas deixe claro que está fazendo um favor e que essa atividade não estava prevista em contrato. Por fim, considero que bons clientes são clientes que dão lucro e não clientes que são agradáveis de conversar.

8. Entregue o mínimo de informação

Essa lição foi uma verdadeira virada de chave para mim. Por muito tempo, acreditei que quanto mais detalhado o projeto – com quatro ou cinco vistas de ângulos diferentes – mais clareza o cliente teria e valorizaria o meu trabalho. No entanto, o efeito foi justamente o oposto: informações espalhadas e em excesso confundiam a equipe da obra e, quando surgia a necessidade de revisar algo, o trabalho se tornava um pesadelo, pois era preciso atualizar dados em inúmeros locais.

Diante dessa situação, embarquei numa jornada de análise de projetos de terceiros e de conversas com público alvo dos projetos, equipes do canteiro de obras, construtores e incorporadores para entender as reais necessidades de quem consome essa documentação. Descobri pontos surpreendentes e adotei medidas e vou compartilhar algumas com vocês:

  • Informação Essencial: Um grande problema era informação desnecessária para o entendimento de determinada fase. Dessa forma passei a incluir somente o mínimo necessário para cada etapa do projeto. Por exemplo, no estudo preliminar, a legenda trazia apenas os elementos relevantes para aquela fase, ao invés de usar uma legenda padrão para todas as etapas.
  • Organização Padronizada: Durante minhas entrevistas, percebi que os engenheiros nunca sabiam exatamente onde encontrar uma informação específica – ela podia estar na primeira folha, na planta baixa, em um corte ou detalhe. Para resolver isso, criamos um manual de leitura dos projetos, onde a primeira folha explica claramente a organização dos dados, assim as pessoas entendiam qual o local que deveria buscar a informação que precisa.
  • Centralização dos Dados: Busquei agrupar todas as informações referentes a um pavimento na própria planta baixa, evitando dispersão. Se necessário, informações adicionais seriam apresentadas na folha seguinte, de forma sequencial. Sem folhas de detalhes ao final do projeto, imagina um engenheiro de obra com centenas de folhas, tendo que lembrar qual a numeração da prancha de detalhes para aquele pavimento, sendo que nem temos um padrão comum de numeração.
  • Classificação e Uniformidade: Organize e agrupe as informações para eliminar repetições de identificadores, cotas ou anotações. Cada tipo de detalhe ou documentação deve ter um conjunto predefinido de dados e um local específico para sua apresentação. A regra é clara: não deve haver informação duplicada. Essa uniformidade não só direciona melhor os leitores – que passam a buscar determinada informação em um único local – como também facilita a criação de um hábito de consulta eficiente. Com essa abordagem, ganhamos tempo na produção e eliminamos erros por informações divergentes. Imagine quase zerar dúvidas do tipo desse tipo.
  • Lista Mestra: Adotei a prática da “lista mestra” – um recurso simples, mas extremamente poderoso. No início, como projetista, eu não via a necessidade, pois sabia exatamente onde estava cada informação nos meus próprios projetos. No entanto, ao começar a analisar projetos de outros profissionais e conversar com construtores, descobri o verdadeiro valor dessa ferramenta. Com uma lista mestra, o processo de validar se todas as pranchas estão disponíveis, na revisão correta e compreender o conteúdo de cada uma se torna muito mais prático. Para facilitar a adoção dessa prática, recomendo o uso de uma tabela com colunas para: número da folha, conteúdo, nome do arquivo e última revisão. Essa organização que eu utilizo.

Enquanto escrevia essa lição, percebi que há muita coisa que eu gostaria de explorar nesse tema – tanto as problemáticas identificadas quanto as soluções adotadas. Acredito que o tema merece um artigo completo, onde eu possa abordar mais exemplos práticos e compartilhar padrões de documentação que utilizo no dia a dia. Se vocês acharem interessante, enviem uma mensagem para que eu possa entender se vale a pena. Por ora, espero que essa abordagem inicial faça vocês refletirem sobre a importância de entregar o mínimo de informação necessário, economizando tempo, evitando complexidade desnecessária e informações divergentes.

9. O projeto não é feito no software

Esse foi o momento em que tudo se conectou para mim: entendi que o software é uma ferramenta poderosa – capaz de agilizar a documentação, identificar conflitos e dimensionar componentes – mas ele não cria projetos. Pelo contrário, quando nos deixamos levar pelo automático da modelagem, focamos em detalhes menores e esquecemos de resolver o problema principal. Como destaquei nas lições 1, 2 e 3, considero que projetar e documentar são coisas muito diferentes. E acredito que o software nunca substituirá o raciocínio e a experiência do projetista.

Todos concordamos que dominar a ferramenta que trabalhamos é essencial, e irá nos economizar muito tempo, mas, sabe qual onde um engenheiro de instalações economiza muito mais tempo quando ele desenvolve a habilidade e confiança para analisar a arquitetura de um edifício de 20 ou 30 pavimentos, entender as premissas do cliente e saber exatamente o que precisa ser resolvido em cada etapa. Trata-se de ter a confiança para escolher a solução adequada para cada sistema, identificar pontos críticos na arquitetura e na estrutura, ter o entendimento de quando as instalações devem se adequar as disciplinas de civil ou quando elas devem ser revisadas, ter mapeado uma biblioteca organizada de conhecimento onde ele acha rapidamente as informações que precisa, e imaginar as soluções para cara parte do projeto em poucos segundos. Essa habilidade tão cedo não poderá ser replicada por uma IA ou por qualquer software.

Posso afirmar com convicção que, à medida que você treina seu raciocínio e estabelece processos para orientar seu pensamento, abrir uma planta baixa ou o isométrico de uma área técnica que se torna uma incrível experiência imersiva. É quase instintivo, em questão de segundos, seu cérebro capta padrões e gera soluções, inconscientemente que nem você é capaz de perceber, os componentes do projeto começam a surgir nos seus olhos e se conectam com tubulações e acessórios na mesma velocidade, e quando você termina usa o software apenas para documentar e validar suas ideias, ajustando o que sua imaginação inicial deixou passar. É semelhante à sensação de usar funções de realidade aumentada, onde os projetos de instalações aparecem sobre o ambiente – é de fato uma experiência incrível, e uma habilidade que muda o jogo quando, quando nos propomos a resolver um ambiente sem depender de visualizar os elementos modelados, sem Revit, QiBuilder, CAD ou até mesmo de um rascunho. Apenas você e sua mente em ação.

Adotar esse caminho foi um divisor de águas na minha carreira. Em reuniões com clientes, eu conseguia pensar rapidamente três ou quatro soluções para um mesmo problema, sem rascunhos ou modelagens, ou até mesmo visualizar a proposta do cliente apenas pela descrição, antecipando conflitos com outras disciplinas. Essa habilidade é que considero extremamente valiosa.

Se você ainda não experimentou essa sensação, comece a treinar: observe o ambiente que deseja projetar e deixe sua mente trabalhar sem auxílio de software ou rascunhos. Se tiver muito difícil de imaginar o ambiente completo, divida-o em partes ou use rascunhos descartáveis, em uma ferramenta de desenho ou papel. Desenvolva essa capacidade e veja como ela transforma sua a sua experiência com a criação de projetos.

Para aprofundar esse tema, tenho um post super interessante no meu Instagram – também disponível no LinkedIn – onde explico com mais detalhes a metodologia que uso para manter o foco e durante a modelagem de projetos. Tenho certeza de que você vai te ajudar com a evolução dessa habilidade.

10. A ferramenta que você desenvolve seus projetos não importa

Pode parecer polêmico, mas a verdade é simples: a única ocasião em que a ferramenta importa de verdade é quando ela é um requisito explícito do cliente – como, por exemplo, o uso do Revit para ambientes integrados à ACC (Autodesk Construction Cloud). Fora esse cenário, se alguém disser que você precisa seguir uma única plataforma ou que tal ferramenta é melhor em todos os cenários, recomendo que não escute, principalmente se essa pessoa estiver te vendendo um curso sobre a ferramenta.

Em situações normais, o mais importante é escolher a ferramenta que torne o seu processo mais eficiente, sem comprometer a qualidade. Afinal, seu cliente raramente se interessa pelo “como” você chega ao resultado, o que ele quer é um projeto adequado, entregue no menor prazo possível e com o menor custo possível, tanto de produção quanto de construção. Para ilustrar, pense: você já viu algum eletricista que usa somente um tipo de alicate? Ou um pedreiro que tenha apenas uma colher de pedreiro na caixa? Da mesma forma, um mecânico dificilmente se contenta em usar apenas uma chave de boca. Ferramentas diferentes resolvem problemas diferentes.

Agora, reflita sobre as implicações de se apegar a uma única ferramenta:

  • Especialização Excessiva: Dominar todos os aspectos de uma ferramenta pode acelerar seus processos dentro das limitações dela, mas essa especialização pode se tornar um obstáculo se surgirem soluções mais eficientes no mercado. Imagine que você seja um expert e consiga documentar um isométrico em 10 minutos, enquanto a média dos outros usuários o fazem em 30, concordamos que é um feito incrível. Mas se eu te disser que enquanto isso um usuário mediano de outra ferramenta faz o mesmo em 5 minutos. Acredito que não é um cenário difícil de imaginar ou impossível de acontecer. Será que não vale a pena explorar outras opções?
  • Dependência de Fornecedores: Ao centralizar toda a sua carreira ou operação em uma única ferramenta, você se torna vulnerável às decisões do fabricante. Seja por mudanças de política, aumento de preços, o encerramento de um produto ou até mesmo que a empresa que você trabalhe mude de fornecedor, essa dependência pode comprometer sua produtividade e, em casos extremos, seu emprego ou negócio.

Eu mesmo, por muitos anos, errei nesse ponto. Concentrei meus esforços em uma única ferramenta e tenho consciência que, principalmente no início da carreira, o foco é importante – mas não a ponto de excluir a experimentação. Dedicar a maior parte do tempo a uma direção pode ajudar a construir uma base sólida, repito, a maior parte do tempo, porém, reservar um espaço para explorar novas soluções traz perspectivas enriquecedoras. Inclusive, mesmo utilizando o Revit, percebi que experimentar outras áreas da mesma ferramenta, como as ferramentas de arquitetura e estrutura, aprimorou significativamente meus processos nas ferramentas MEP.

Além de tudo que comentei, há uma tendência crescente no mercado com o movimento Open Source e o na nossa área o Open BIM, onde a ênfase está em formatos de arquivo abertos e softwares abertos. Essa abordagem oferece benefícios como a ausência de taxas, maior personalização, a liberdade de não ficar refém de um único fornecedor e se o projeto for descontinuado você mesmo pode dar continuidade a sua versão.

Recomendo o seguinte processo para escolha de ferramentas: pesquise o máximo de opções disponíveis para sua área, assista a vídeos, converse e leia opiniões de outros profissionais. Crie uma “caixa de ferramentas” – um arquivo de registro das soluções que você encontrou e os problemas que cada uma resolve. Teste e compare as alternativas, entendendo as vantagens e limitações de cada uma e em seguida adote as melhores opções no seu fluxo.

Hoje eu sigo a seguinte abordagem e recomendo que vocês façam algo parecido. Recomendo que você tenha uma ferramenta principal, complementada por outras que sejam úteis em contextos específicos, e, pelo menos, uma alternativa Open Source. Por exemplo, no meu caso em projetos IHS, uso o Revit para projetos mais complexos e que precisam de muita personalização, mas adotei o Qi Builder em projetos mais tradicionais. Embora eu inicialmente fosse um “hater” do Qi Builder, descobri – por meio de relatos de colegas – que ele é extremamente otimizado para o mercado nacional e traz ganhos significativos em produtividade para situações convencionais, avaliando o tempo de desenvolvimento de projetos residenciais, descobri que eu levava o dobro do tempo quando comparado aos meus colegas, e foi o que motivou a experimentar. Contudo, quando o projeto exige soluções mais personalizadas, a flexibilidade do Qi Builder é limitada, o que me obriga a recorrer ao Revit. Essa minha abordagem pode mudar com o tempo, conforme novas ferramentas surgem e minhas necessidades evoluem. Com relação a solução Open Source, estou experimentando algumas opções, mas nenhuma fez meus olhos brilhar. Também quero explorar as ferramentas da Bentley principalmente para projetos de infraestrutura.

Recapitulando, recomendo que você domine uma ferramenta, mas sem se fechar para as possibilidades. Saia da zona de conforto, teste novas abordagens e, assim, amplie seu repertório – e seus argumentos – para escolher a melhor ferramenta para cada situação.

11. Muito provavelmente você não trabalha com BIM

Não acreditem apenas em mim – confiem na Building Smart. A organização define o BIM como “um processo colaborativo que utiliza um modelo digital compartilhado para representar as características físicas e funcionais de um ativo construído”. Esse modelo não se resume à representação gráfica em 3D; ele integra informações detalhadas sobre materiais, sistemas, custos, cronogramas, sustentabilidade e outros dados essenciais para apoiar decisões ao longo do ciclo de vida da edificação.

Reflitam sobre cada ponto dessa definição “superficial” de BIM e perguntem a si mesmos: será que todos os projetos vendidos como BIM cumprem integralmente esses requisitos? Ao nos aprofundarmos nos aspectos técnicos e metodológicos, a realidade se torna bem mais complicada.

Não quero generalizar. Talvez uma pequena parcela do nosso mercado realmente extraia valor da metodologia BIM. Contudo, a imensa maioria não o faz. É vendido uma fantasia: muitos tentam encaixar o conceito de BIM num “xadrez mental”, inventando dimensões e requisitos para que possam sustentar seu produto. Mas, se fizermos uma análise fria, percebemos que a realidade é outra. Um modelo com uma motobomba bonitinha, reproduzida com precisão segundo o modelo de referência de um fabricante, pode ser até legal – mas, sem os dados essenciais para planejamento, manutenção, orçamento, construção e operação, não diz nada. Da mesma forma, um projeto cujo resultado final é um PDF e pranchas de CAD com quantitativos “mais ou menos precisos”, que o cliente não confia para orçamento e acaba precisando ser todo levantado pelos orçamentistas, também não é BIM.

Mesmo reconhecendo que existem níveis e objetivos distintos, a mensagem que quero transmitir é simples: o maior beneficiário de um fluxo de projetos BIM é o contratante, ele quem consegue extrair valor das informações e fazer as coisas acontecerem. Quando não há um objetivo claro para os modelos – sem requisitos definidos de nível ou padrão de informação – os dados do modelo dificilmente serão utilizados. Na prática, o que a maior parte dos contratantes buscas é as pranchas em CAD e PDF e as planilhas de Excel com as quantidade aproximadas. Por que se preocupar com um modelo BIM repleto de detalhes precisos, se você nem sabe, de antemão, qual a marca ou especificação que seu cliente pretende adotar em cada sistema da obra? E, acima de tudo, você já analisou se o seu cliente está disposto a pagar por esse nível de informação, por que investir tempo e energia em algo que não fará diferença?

Convido-os a refletir: não seria mais interessante dedicar tempo à solução do projeto em si do que buscar a família de aquecedores perfeitamente modelada conforme a sua especificação? Por que não utilizar um retângulo paramétrico, que permita adaptar o tamanho e a posição das conexões conforme a necessidade, sem gastar horas com bibliotecas complexas e componentes excessivamente específicos?

A menos que o seu cliente consiga extrair valor real do BIM e pague por projetos que sigam suas diretrizes, pode ser mais vantajoso investir em melhorias nas áreas que ele realmente vai utilizar, de forma que ele confie no material que você está entregando. No fim das contas, essa abordagem ao passar dos anos, vai te aproxima você de um fluxo BIM verdadeiro, ao invés de se contentar com uma documentação meia boca, subir um arquivo IFC exportado de qualquer jeito no Google Drive e fingir que o projeto está compatibilizado, sem trocar uma mensagem com os outros envolvidos.

Tenho conversado com muitos profissionais que utilizam nossos projetos e descobri que, na prática, as prioridades são bem diferentes das prioridades que nossa “bolha” de projetistas enaltece. Não estou dizendo que a representação de um projeto ou o BIM são descartáveis; apenas acredito que, para a maioria dos empreendimentos do nosso mercado, eles não são prioridade e podem representar um desperdício de recursos. Se o cliente não possui uma estratégia de marketing bem definida, dificilmente um render realista ou uma visualização de alta qualidade trará valor prático – imagine um engenheiro de obra que, com uma prancha impressa em mãos contendo seu detalhe ultra realista, economize mais do que o custo investido para produzi-la. Da mesma forma, um arquivo IFC com geometria impecável, que quando o engenheiro vai pegar analisar a especificação de uma motobomba está diferente da especificação em prancha, não inspira muita confiança, nem encoraja os consumidores de nossos projetos a buscar por esse tipo de coisa.

Por fim, converse com seu cliente. Entenda qual a necessidade real em termos de informação, qual o uso que ele deseja dar ao modelo e como a equipe dele irá utiliza os projetos. Direcione seu esforço para entregar valor onde ele é realmente necessário, em vez de produzir informações “descartáveis”.

12. A beleza custa caro e seu cliente pode não quer pagar por ela

Da mesma forma que seu cliente pode não estar disposto a pagar por todas as informações que um modelo BIM oferece, ele também pode não valorizar renderizações realistas de alta fidelidade, níveis excessivos de detalhamento ou projetos com geometrias minuciosamente detalhadas. É fundamental lembrar que cada elemento adicional no seu projeto tem um custo – seja em horas de trabalho dedicadas à modelagem ou em tempo perdido com computadores sobrecarregados e travamentos.

A experiência é comum: quem nunca viu o Revit travar ao tentar editar um componente ou ajustar um material, fazendo com que horas de trabalho sejam desperdiçadas? Esse custo adicional não pode ser ignorado. Se você não repassar esse valor ao seu cliente, sua margem de lucro pode ser comprometida.

Por isso, certifique-se de que o cliente reconheça o valor da apresentação do projeto, que haja uma utilidade real para essa informação e que ele esteja disposto a pagar por esse nível de detalhe. Uma alternativa inteligente é desenvolver produtos diferenciados – isto é, criar projetos com padrões de desenvolvimento distintos para atender às necessidades específicas de cada cliente, sem produzir informações desnecessárias. Lembro de um caso em que apenas a modelagem do projeto, sem qualquer tipo de documentação, atendia perfeitamente às necessidades do construtor; em outro, o construtor precisava do projeto apenas para a casa de máquinas e o lançamento dos pontos. Em ambos os casos, conseguimos reduzir significativamente o valor do contrato, o que se mostrou um diferencial importante para a contratação, pois atendia exatamente o que era relevante para aqueles empreendimentos, entendo que dar desconto nunca é uma opção quando você tem um controle do custo de produção, para reduzir custos de um contrato específico a única alternativa é alterar o escopo. E esses escopos resolviam o problema do cliente, por mais que não fosse minha escolha se estivesse na posição deles, não posso assumir que sei o que é melhor para ele.

Não irei me alongar mais, pois já discutimos extensivamente a questão da informação descartável no tópico anterior.

13. Desça do pedestal: seu projeto não será lido pela realeza

A maioria das pessoas com quem converso nunca parou para refletir sobre quem realmente utiliza os seus projetos. Você sabe, de fato, qual é o público-alvo dos seus trabalhos? Quem são as pessoas que vão consultá-los – apenas o pessoal da obra ou equipes de outros setores? Qual é o ciclo de vida do seu projeto e quais profissionais se beneficiam dele antes que ele seja descartado?

Para cada uma dessas perguntas, existem inúmeras respostas aceitáveis. Os usuários podem variar desde equipes de fábricas de kit até os “Valdomiros gesseiros” das obras, passando por profissionais com níveis de instrução e necessidades muito diferentes.

Em determinado momento, resolvi buscar essas pessoas para entender como o meu projeto era utilizado por cada uma delas. (Deixo claro: não estamos aqui para ajustar o mundo inteiro – só podemos controlar o que está ao nosso alcance.) Durante essas longas conversas, percebi que eu estava criando projetos para um público com alto conhecimento técnico em instalações, quando, na verdade, esse grupo representava a menor parcela dos usuários. Não falo apenas de especialistas, mas também de orçamentistas, engenheiros de obras, mestres, auxiliares de engenharia e estagiários – profissionais que, na correria do dia a dia, não têm tempo para estudar cada detalhe da documentação. Eles precisam de soluções rápidas: abrir, visualizar e tomar decisões.

Essa experiência revelou três problemas principais enfrentados pelos consumidores dos meus projetos:

  • Conhecimento Técnico Limitado: Muitos não possuem domínio avançado sobre instalações.
  • Tempo Escasso: A documentação precisa ser analisada rapidamente, sem demandar estudos longos.
  • Baixo Nível de Instrução Formal: Para parte dos usuários, sistemas organizacionais complexos, siglas excessivas e múltiplas vistas podem atrapalhar mais do que ajudar.

Diante desses desafios, decidi reformular meus projetos para melhor atender às reais necessidades dos usuários. Algumas ações adotadas foram:

  • Linguagem Simples e Direta: Toda informação deve ser apresentada da forma mais clara possível.
  • Uso Moderado de Siglas: Adote siglas somente quando forem amplamente conhecidas ou quando a informação completa dificultar a compreensão.
  • Visual Limpo nas Pranchas: Estabeleça padrões que evitem a poluição visual, apresentando apenas o essencial.
  • Anotações Orientativas: Inclua diretrizes que indiquem onde o leitor pode encontrar informações específicas, como “analise a prancha X” ou “veja o detalhe Y”.
  • Planta Baixa Funcional: A planta do pavimento não precisa conter todos os detalhes – ela deve, ao contrário, orientar o leitor sobre onde encontrar a informação necessária, sem sobrecarregá-lo com identificadores ou cotas desnecessárias.

Após adotar essas mudanças e alinhar meus projetos às necessidades reais dos usuários, o nível de aceitação aumentou consideravelmente. Passamos a receber menos críticas e reclamações, justamente porque simplificamos e removemos o excesso de informação. O segredo não está em adicionar mais conteúdo, mas em identificar o que pode ser eliminado sem prejudicar a compreensão. Afinal, não podemos assumir que sabemos o que é melhor para o cliente – é preciso ouvir e adaptar.

14. Permita que o cliente experimente o “queijo” de graça

ÉÉ hora de aprender com os vendedores ambulantes: quem nunca experimentou uma amostra de queijo grátis passando na esquina, adorou e pediu meio quilo para levar para casa? E o melhor de tudo é que nem saímos de casa para comprar queijo.

Ao longo deste artigo, pode ter ficado a impressão de que sou contra entregar mais do que o cliente contratou ou adotar novas tecnologias e inovações no projeto. Nada disso. Sou um grande entusiasta de inovações, e entregar produtos de excelência que encantem os leitores está no meu DNA. Adoro vistas realistas, modelos detalhados e até as tarefas de projetar minuciosamente a posição de cada suporte ou base de fixação – é natural para quem projeta querer controlar todos os detalhes.

Porém, depois de muitas experiências frustradas, aprendi que não podemos comprometer prazos ou margens de lucro fazendo entregas “a mais” gratuitamente. O overdelivery – ou seja, o esforço extra para aprimorar o projeto – deve ser encarado como um investimento no relacionamento com o cliente e não como algo rotineiro e sem controle.

Voltando à analogia do queijo, a lição é a seguinte: a melhor forma de entregar valor é oferecer uma pequena amostra para que o cliente experimente. Você não precisa de detalhes realistas e minuciosos em todas as pranchas de todas as disciplinas, inserir QR codes com orientações construtivas em cada detalhe ou criar uma visualização 360 para todas as vistas do modelo. O ideal é aplicar essas melhorias de forma pontual, demonstrando que existem novas possibilidades para o cliente e que você pode fornecê-las. Permita que o cliente veja, experimente e decida se, na próxima vez, ele deseja levar o pacote completo.

Além de inserir essas “iscas” no projeto, é fundamental incentivar e orientar o cliente sobre como usar essas funcionalidades e, principalmente, colher feedback. Essa prática criará muito mais abertura para novos produtos, além de gerar uma demanda “espontânea”, sem desconfiança e com base no valor percebido das inovações.

Portanto, sim, você pode – e deve – propor melhorias, adicionar novas tecnologias e encantar seu cliente. Apenas tenha cuidado para não fazê-lo de graça ou tornar essa “surpresa” uma obrigação contratual, na qual o cliente pague por algo que, no fim das contas, não lhe traga benefícios reais.

Conclusão

Eu adorei escrever este artigo. Inicialmente, tudo começou como um roteiro para um vídeo de 10 minutos para o meu canal no YouTube, mas à medida que fui explorando os temas, percebi o quanto poderíamos aprofundar a discussão. Acabei transformando a ideia em um artigo – embora eu tenha precisado condensar algumas seções para evitar que ficasse excessivamente longo.

Fica claro que nossa área é repleta de assuntos importantes que, muitas vezes, não são debatidos abertamente. Pretendo me aprofundar em diversos temas aqui levantados, como open source, open BIM, padrões de projeto, padrões de informação, levantamento de requisitos, nível de entrega, escopo de contrato, entre outros. Se você tiver interesse em algum tema específico, envie uma mensagem ou deixe um comentário. Prometo realizar uma pesquisa detalhada e criar um conteúdo denso sobre a proposta.

Encerramos aqui com os aprendizados que considero mais relevantes que obtive ao longo da minha carreira como engenheiro de instalações. Espero que algum deles inspire você a evoluir suas entregas, assim como eu aprendi muito com as experiências de outros profissionais, quero compartilhar as minhas para que os próximos façam o mesmo.

Eu sou Pabllo Dantas e esta é a minha pequena contribuição para a comunidade.

Data da primeira publicação, 03 de março, 2025.

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